Precisamos Mesmo de uma Missão?
Por anos me irritei quando consultores nos indagavam sobre missão, visão e valores na Bio Bureau. Eles insistiam nesses aspectos, mas eu nunca consegui oferecer uma resposta satisfatória. A solução frequentemente proposta era a elaboração de um plano estratégico para esclarecer esses elementos. Mas significava um esforço tão colossal que nos afastava das operações cotidianas do negócio. O esforço para ter um propósito parecia maior que o propósito em si e não fazíamos nada.
E eu não parecia estar sozinho nessa hesitação. Guy Kawasaki disse em uma de suas apresentações: ‘Quem de nós nunca teve a terrível experiência de um evento corporativo para construir trabalho em equipe e elaborar uma declaração de missão?’
As missões pareciam uma sinalização de virtude, muito mais do que uma expressão do negócio. Guy propôs a ideia de um mantra, algo que poderia ser expresso em três palavras e estivesse absolutamente alinhada com o negócio.
A descoberta do conceito de startup enxuta de Steve Blank e do business model canvas acabaram validando algo que eu sentia, mas não conseguia articular: o essencial para uma startup, ainda sem um produto ou mercado validado, não é a missão ou a visão, mas a validação da sua proposta de valor junto aos clientes. Uma startup não falha por falta de uma missão clara: falha pela ausência de clientes. Esta ideia ressoou profundamente em mim. A inexistência de uma missão, visão ou valores definidos nunca impediu a Bio Bureau de realizar negócios ou resolver problemas internos e externos. No entanto, muitos dos nossos projetos falharam devido à ausência de uma proposta de valor convincente.
O mantra em três palavras de Guy era, mais do que uma declaração da missão, uma declaração da proposta de valor.
Apesar das justificativas válidas e das alternativas interessantes apresentadas por Kawasaki, eu sabia que parte da minha resistência estava relacionada à minha dificuldade em definir claramente o nosso próprio negócio. E falta de clareza sobre o negócio não é um bom sinal.
Então, quando Moulin sugeriu um encontro dedicado a essa questão, eu fui de mente aberta.
Definindo Nossos Valores
A discussão se desenrolou de maneira inesperada. Ele começou destacando que a missão deve ser estabelecida pelos fundadores, a visão compartilhada pelas lideranças e os valores aceitos por todos.
Assim, definimos como propósito da Bio Bureau valorizar, preservar e restaurar a biodiversidade através do desenvolvimento de produtos e serviços com biotecnologia. Também estabelecemos a meta de lançar no mercado três produtos, serviços ou empresas baseados em biodiversidade até 2026. Para minha surpresa, a decisão foi aceita por todos, sem contestação ou entusiasmo aparente.
A discussão aconteceu na definição dos valores. Todos propuseram conceitos: ética, proatividade, efetividade, alegria, clareza, ousadia, resiliência, responsabilidade, inovação, camaradagem, bom ambiente de trabalho, propósito, comprometimento, desafio, planejamento, meritocracia. Ao final de uma votação, a responsabilidade, proatividade e ousadia se destacaram. O conceito de ‘accountability’ emergiu como crucial.
Durante esse processo, questionei se os valores decididos resistiriam em tempos difíceis. Seriam eles comprometidos se as coisas não estivessem indo bem? Eles se sustentariam em cenários como o fechamento da empresa? Não cumprimento de orçamentos ou prazos, a perda de membros essenciais da equipe ou danos à reputação do negócio?
Ao fim, decidimos que os valores da Bio Bureau seriam: accountability, proatividade, ousadia, clareza e ética.
Ao confrontar esses valores com as ações que tomamos em situações adversas, como a recente pandemia, não encontrei nenhuma ação que violasse esses princípios.
Concluí que os valores foram bem escolhidos e refletiam fielmente o nosso modus operandi.